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Reflorestar a Amazônia para recuperar o ciclo da água

Reflorestar a Amazônia para recuperar o ciclo da água

Por Opinião/IPAM

Por Thomas E. Lovejoy e André Guimarães

O último relatório do IPCC (sigla em inglês para Painel Intergovernamental de Mudança do Clima da ONU) chamou atenção. Precisamos enfrentar esse desafio climático global de modo efetivo, e para tal devemos concentrar esforços em alguns elementos fundamentais. A Amazônia é um desses elementos fundamentais. Ela se encontra no início de um ponto de inflexão que traz implicações imensas para o clima sul-americano, a sustentabilidade e o Brasil como potência agrícola e econômica. A perda potencial de carbono dificultará assustadoramente o resultado sustentável de um desafio climático. Em última análise, a Amazônia constitui um desafio brasileiro, sul-americano e global.

A Amazônia produz cerca de metade de suas próprias chuvas pela evaporação dos bilhões de árvores que a compõe. Esse processo começa com a umidade que chega do Atlântico tropical, e a grande floresta amplia essa marcha até a massa de ar chegar aos Andes, ascender, esfriar e formar o sistema fluvial amazônico —o maior de todo o planeta, com quase 20% de toda a água doce.

Agora, no sul e leste da Amazônia, já se chegou ao ponto em que, sem uma contraintervenção humana, a umidade é insuficiente para impedir que a floresta se converta em vegetação de savana. Os impactos que o ciclo hidrológico enfraquecido terá mais para o sul vão reduzir os benefícios à agricultura e aos reservatórios em quase todos os países da América do Sul, exceto o Chile.

O cultivo da soja no Brasil e Paraguai diminuiu em 910 mil toneladas em 2019, das quais 500 mil se deveram às condições de seca crescente. As projeções para o futuro são ainda mais desencorajadoras, remetendo ao “Dust Bowl” dos anos 1920 nos Estados Unidos (revertido mais tarde pela revegetação proativa).

A agropecuária é uma das bases da economia brasileira, da qual representa um terço. Uma indústria pecuária sustentável e bem-sucedida é de fato possível e seria bem-vinda por frigoríficos, exportadores e mercados da Europa e de outras partes do mundo. De fato, alguns anos atrás a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) demonstrou que a pecuária aprimorada na Amazônia seria capaz de dobrar a produção de gado usando metade da terra.

Enquanto isso, com cortes profundos nos orçamentos de fiscalização, o desmatamento prossegue, bem como as queimadas e os incêndios florestais. Com menos umidade por conta do desmatamento, o ponto de inflexão de floresta tropical para savana no sudeste da Amazônia brasileira vem se manifestando em estações de seca mais longas, temperaturas mais altas, precipitação pluviométrica reduzida e uma mudança na composição das espécies arbóreas —de árvores que prosperam em condições úmidas para espécies que se dão bem em condições secas.

O reflorestamento no sudeste da Amazônia (que abrange áreas importantes de terras agrícolas abandonadas) pode ajudar a restaurar o ciclo hidrológico. Independentemente dos detalhes, o que se faz necessário são mais folhas, mais árvores —enfim, mais floresta. Isso ajudaria a restaurar o ciclo hidrológico crítico e ao mesmo tempo sequestrar carbono, contribuindo assim para a meta brasileira sob o Acordo de Paris, ainda não cumprida, de restaurar 12 milhões de hectares de floresta.

Isso deve fazer parte de uma nova visão para a Amazônia como um todo. O que é necessário é um misto das atividades já promissoras (por exemplo, a aquicultura) que possam ser ampliadas, cidades sustentáveis que não onerem demais a floresta circundante e uma reavaliação séria da infraestrutura em relação ao que é, em essência, uma visão muito superada que data de meados do século 20.

Com 100 bilhões de toneladas de carbono na Amazônia, isso é crucial para fazer frente à emergência climática mundial. A própria Amazônia precisa ser administrada com o sistema que ela manifestamente é, mas também como parte integral do bem-estar ambiental de toda a América do Sul.

Há uma necessidade e oportunidade crítica de o Brasil recuperar o papel de liderança que assumiu após o assassinato de Chico Mendes em dezembro de 1988, quando o país buscava promover a lei e a ordem, e quando sediou a Cúpula da Terra, no Rio de Janeiro, em 1992.

O país precisará de recursos e parceiros, mas é de seu interesse imediato e de mais longo prazo exercer esse papel no meio ambiente e na sustentabilidade do continente sul-americano. Isso beneficiaria a região, com crescimento econômico sustentável, e o mundo, com segurança alimentar e a mitigação da mudança climática.

Tradução de Clara Allain.

Thomas Lovejoy – Professor de ciência e política ambiental na George Mason University (EUA).
André Guimarães – Diretor-executivo do Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia).

O artigo foi publicado originalmente na Folha de S. Paulo.

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Fogo de desmatamento na Amazônia ao norte de Mato Grosso. (Foto: Bibiana Garrido/IPAM)

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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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