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Pré-História no Planalto Central: Sítios Arqueológicos

Pré-História no Planalto Central: Sítios Arqueológicos de Formosa, Veadeiros e Paranã 

O texto que se segue é uma preciosidade do historiador Paulo Bertran, publicado em seu livro “História da Terra e do Homem no Planalto Central – Eco-História do Distrito Federal – Do Indígena ao Colonizador.” Editora UnB, edição 2011.

Por Paulo Bertram

De forma geral, esboçam-se para a pré-história dos últimos 10 mil anos três grandes fases de ocupação que ganharam, por epíteto, nomes da regiões onde foram mais nitidamente pesquisadas e catalogadas.

Temos, assim, a fase Paranaíba – da grande tradição brasileira denominada Itaparica -, a mais antiga, datando de 10.500 a 9 mil anos AP, e que é caracterizada por grupos de caçadores que viveram em um período mais frio e úmido que o atual.

Logo em seguida, a fase Serranópolis, que durou até os anos 1000 da nossa era, de clima mais quente, permitindo ao homem pré-histórico uma alimentação retirada da caça generalizada, da pesca e da coleta de molusco e répteis, tornando-o mais sedentário e ligo a uma cultura nascente.

Finalmente a fase Jataí, do último milênio, na qual os grupos indígenas levavam uma vida bastante sedentária, produzindo utensílios variados e  objetos de cerâmica, alimentando-se de produtos agrícolas e da coleta silvestre.

Ecossistemas diferenciados, como o cerrado e as matas, proviam, em diversos períodos do ano, aos grupos pré-históricos produtos naturais como o pequi, a guariroba, o babaçu, a marmelada do campo, o bacupari, muricis, pitangas, araticum, gabirobas, ananás, etc.

Assim, particularmente, interessa aos arqueólogos a pesquisa dos sítios pré-históricos situados em pontos de transição entre ecossistemas diversificados.

Explica-se isso pela óbvia ampliação das fontes e de espécies de alimentos ao alcance dos grupos humanos primitivos segundo seu habitat: cerrados, campos limpos, matas ciliares, matas calcáreas, geraes, caatingas, cada qual com sua especialidade nutricional.

Definidos esses sítios privilegiados, traçavam-se por todo o país “caminhos”, melhor dizendo “estações” indígenas que serviriam depois de rastilho mortífero para a sanha dos bandeirantes paulistas e nordestinos.

Sítio arqueológico achado no Paranoá – Foto JP Rodrigues/Metrópole

Arqueologia no Distrito Federal 

A região do Distrito Federal preenche alguns requisitos para ser considerada como área interessante sob o ponto de vista do povoamento pré-histórico.  O triplo divisor de bacias hidrográficas deveria ser, no passado remoto – bem como o seria no século XVIII -, um caminho inevitável para as migrações.

Igualmente, existem  dentro do Distrito Federal alguns pontos de contato entre ecossistemas diferenciados, zonas de transição de campo limpo para cerrado e para mata que, segundo os parâmetros levantados pela escola goiana de arqueologia, poderiam delimitar sítios pré-históricos interessantes.

Trina anos depois da fundação de Brasília, o arqueólogo Eurico Teófilo Miller, pôs lume às primeiras evidências de sítios pré-históricos no Distrito Federal, particularmente na região do Gama.

Em 1991, encontrou dois sítios com restos de cerâmica e artefatos de pedra, espalhados por uma área de 3.000 m2, nas cabeceiras do córrego Ipê, hoje Universidade Holística e Cidade da Paz, em antiga região de mata, derrubada em 1960.

O sítio apresenta a particularidade de, em sua parte central, apresentar indícios cerâmicos e pré-cerâmicos (líticos). Considera o Dr. Miller a hipótese de que o material  lítico seja mais antigo que o cerâmico, ao qual se misturou devido a perturbações que tenham levado ao afloramento do material mais antigo.

Pesquisou também o Dr. Miller e equipe as regiões vizinhas ao Catetinho e ao Recanto das Emas, nada encontrando, talvez por não disporem de ambiente natural favorável.

Muito melhor sucedidas foram as pesquisas foram as explorações no ribeirão Ponte Alta, a oeste do Gama. Em área de poucos quilômetros quadrados, encontraram-se vestígios de quatro sítios arqueológicos indígenas, dois deles também com características cerâmicas e pré-cerâmicas, um sobre o outros, cobrindo uma área superior a 5 hectares.

O sítio cerâmico configura uma aldeia indígena formato circular, que, na opinião do Dr. Miller, são características da tradição Jê. Ainda na área de Ponte Alta, foram localizados mais dois sítios exclusivamente cerâmicos, um deles grande e de formato circular.

Todos esses sítios do Gama apenas foram detectados, mas não escavados. Considerando-se, porém, ter aquela pequena porção do território – cujo ambiente natural nem tanto prima pela excelência do habitat – revelado nada menos do seis sítios pré-históricos, é lícito supor a existência de dezenas de outros em diferentes ambientes favoráveis do Distrito Federal.

Teve o Dr. Miller a gentileza de nos adiantar pessoalmente os resultados inéditos de suas últimas pesquisas.

Em princípios de 1993, vieram alume em Taguatinga, na área do Córrego Melchior, cinco sítios pré-cerâmicos, com características de acampamentos de caça, talvez reocupados de tanto em tanto por pequenos grupos.

Já a messe de 1994 foi abundante: nada menos do que 16 sítios arqueológicos na área do rio Descoberto. Desses, nove eram de grupos pré-cerâmicos, dois de cerâmicos e cinco eram “taperas” de fazendas coloniais. Há um detalhe curioso: uma das ruínas de fazendas assentava-se exatamente sobre um sítio arqueológico indígena pré-cerâmico.

Insistindo com o Dr. Miller, adiantou-nos – com muita precaução e em caráter de hipótese – que alguns desses sítios pré-cerâmicos poderiam datar de 7.000 a 7.500 anos de idade, desde a instauração do atual ótimo climático, chegando, porém, eis a surpresa até os tempos históricos da colonização.

Em outros termos: poderiam ter convivido no Distrito Federal duas culturas indígenas distintas. Aquela antiquíssima de caçadores pré-cerâmicos, e outra, novíssima, de apenas mil anos, de agricultores ceramistas, como adiante veremos, e ambas chegando até a invasão colonizadora…

Ora, Joseph de Mello Álvares escrevia, em fins do século XIX, que os remanescentes indígenas do Distrito Federal – então prudentemente escondidos nas brenhas do rio Maranhão – eram das nações Crixá, Xavante e Pedra Branca.

Os Crixá, hoje extintos, eram agricultores e ceramistas, como adiante veremos. Os Xavante são exímios caçadores, mas a moderna etnografia não os considera pré-cerâmicos. Resta o mistério dos índios Pedra Branca, que deviam ser muito arredios, pois a sua designação portuguesa denuncia poucos contatos com o colonizador. Seriam os tais caçadores pré-cerâmicos?

Mas como responder a essas questões, sem fazer as escavações necessárias, os exames precisos?

precisos?  Estamos todos a dever ao Dr. Eurico Miller, pai da arqueologia do Distrito Federal, as condições mínimas para que passe ao estágio das escavações, restituindo-nos, quem sabe em um museu – esses fragmentos da história indígena regional.

Foto: Bhaz

Sítios de Formosa, Veadeiros e Paranã

Antes das pesquisas pioneiras do Dr. Miller no Distrito Federal, foram registrados grandes progressos na pesquisa arqueológica de sítios e abrigos pré-históricos no vizinho município de Formosa.

Segundo uma resenha dos professores Pedro Ignácio Schmitz e Altair Sales Barbosa (1984), cadastram-se ali cerca de 29 grutas, complexo esse inserido ecossistema de cerrado com mata próxima.

Em sete desses abrigos, tetos e paredes são pintados com figuras em geral monocrômicas, em tons variados de vermelho, preto e, mais escassamente, com associação das duas cores. Predominam representações geométricas e, mais raramente, desenhos de pequenos animais e pisadas humanas. Seja em superfícies lisas ou irregulares, as grutas de Formosa apresentam variado tratamento de desenho ou entalhe.

Para os pesquisadores, representações semelhantes às de Formosa encontram-se em Sete Cidades, no Piauí. Eis, portanto, que a presença dos nordestinos no Planalto Central pode ser muito mais antiga do que sonha a nossa vã filosofia…

Finalmente, fechando a região norte de Brasília, temos a área arqueológica da Chapada dos Veadeiros e do Vão do Paranã, também inseridos em ecossistemas de cerrado associado a matas.

Ao contrário das pinturas de Formosa, abundam ali os petroglifos, inscrições em pedra. Os motivos são abstratos, predominantemente geométricos, geralmente obtidos por polimento nas rochas, com dimensões variadas e uma grande diversidade de formas. Até 1982, haviam sido levantados 90 sítios de grande antiguidade na região.

O professor Altair Sales Barbosa considera que, pelas características de estilo, podem-se notar nos petroglifos de Alto Paraíso e do Vão do Paranã semelhanças com as sinalizações encontradas na localidade goiana de Itapirapuã, na bacia do Araguaia.

A sudeste do Distrito Federal, a mineira Unaí também vem mostrando, em dois abrigos rupestres, restos de ocupação que remontam a 10 mil anos.

Não obstante o visto, pouco ainda se pode concluir, a não ser o armazenamento de conhecimentos fragmentados que formam a cada ciclo de investigações arqueológicas, mais uma peça do variado mosaico da nossa pré-história.

Foto: Viagem e Turismo


Block

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

 

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