Assassinato de Marielle: quatro anos sem punição dos mandantes
Os advogados das famílias de Marielle e Anderson informaram que irão protocolar um mandado de segurança, na manhã desta segunda-feira, no Tribunal de Justiça do Rio. Eles querem o compartilhamento das informações dos autos de investigação sobre os mandantes do assassinato.
“Entendemos que o Estado brasileiro tem a obrigação de fazer cumprir o direito das famílias das vítimas participarem de maneira formal e efetiva da investigação”, dizem o defensor público Fábio Amado, representante das famílias de Marielle e de Anderson, e a advogada Luciana Pivato e Giane Álvares, representantes de Mônica Benício, todos responsáveis pelo caso.
Investigações apontam milícia
Conforme as investigações, o crime teve envolvimento da milícia. Em entrevista à CNN, o diretor para a América Latina e Caribe da Open Society Foundations, Pedro Abramovay, aponta relação do atentado com a potência dos grupos paramilitares.
“Quando começaram as investigações, fomos vendo que foi um crime muito sofisticado, muito bem planejado, e trouxe luz sobre a existência desses grupos de assassinos políticos. Isso dá carta branca para outros assassinatos políticos”, diz ele.
Executores estão presos, mas mandantes não
Os executores do crime foram presos. Desde 2019, o sargento reformado da polícia Ronnie Lessa e o ex-policial militar Élcio de Queiroz estão detidos. Os dois respondem por duplo homicídio triplamente qualificado por motivo torpe, emboscada e sem dar chance de defesa às vítimas e vão a júri a popular. Ainda não tem data para o julgamento.
Após 1.461 dias do assassinato, os mandantes não foram descobertos nem a motivação do crime que chocou o Brasil e o mundo. Segundo o Ministério Público, a principal hipótese é motivação política. Para a Polícia civil, o caso é um duplo homicídio.
De acordo com as investigações, Ronnie Lessa foi o autor dos disparos e Élcio de Queiroz dirigia o carro da emboscada. Eles negam participação do crime.
Linha do tempo do crime
No site do Instituto Marielle Franco, além da campanha “Março por Marielle e Anderson”, um compilado com a linha do tempo sobre a crime e 14 perguntas sem respostas, resgatam o ocorrido.
Conforme o instituto, o caso é mais que um marco na história de violações de direitos no Brasil e um atentado contra a democracia, pois “o episódio e sua investigação marcaram a história da polícia fluminense e auxiliou na abertura de investigações de diversos outros crimes do estado.”
No dia 14 de março de 2018, o Brasil foi abalado pela trágica notícia dos brutais assassinatos da vereadora Marielle Franco e de seu motorista Anderson Gomes. Sob a forte pressão da sociedade brasileira, mas também da opinião pública internacional, as investigações chegaram até os executores, mas não a seu mandante. As famílias de Marielle e Anderson e a sociedade democrática brasileira querem e precisam saber quem foi o mandante, pois na origem desse crime está a mesma motivação política que mata rotineiramente todos e todas que lutam por direitos e justiça no Brasil. A nossa luta para que a justiça seja feita a Marielle e Anderson, com a prisão do mandante desse crime hediondo, vai continuar. Marielle Franco sempre irá inspirar a luta das mulheres, principalmente das mulheres negras por igualdade racial e de gênero e por justiça social – Benedita da Silva, deputada Federal (PT-RJ)
Pedidos de Justiça
Em mais um dia de dor para a democracia, Lula, a presidenta do Partido dos Trabalhadores (PT), Gleisi Hoffmann, e diversos parlamentares se manifestam por pedidos de justiça em suas redes sociais (veja abaixo).
Confira atos e reuniões de “Março por Marielle e Anderson” no portal do Instituto Marielle Franco: https://www.institutomariellefranco.org/4anos
Atos nesta segunda, 14, no Rio de Janeiro
- 9h: ação em frente ao Tribunal de Justiça, no centro do Rio de Janeiro, exigindo acesso aos autos e a solução do crime.
- 9h às 16h: A partir das 9h, a Anistia Internacional Brasil fará uma intervenção urbana com uma instalação com mais de 2 metros de altura, em frente à Câmara dos Vereadores, no centro do Rio. A instalação simula o processo judicial inconcluso até agora, destacando a falta de acesso das famílias das vítimas e seus advogados às informações.
- 10h30: Missa na Igreja de Nossa Senhora da Candelária, organizada pela família de Marielle, que segue, na sequência, para a intervenção da Anistia Internacional Brasil na Câmara dos Vereadores, por volta das 12h.
- 11h: Encontro prévio com o juiz auxiliar Rafael Estrela, o diretor de comunicação José Carlos Tedesco e a advogada do Instituto Marielle Franco, Brisa Lima, representando o comitê para falar sobre as pautas que serão discutidas com o presidente do TJ, Henrique Carlos Figueira.
- 15h: Reunião com o governador do Rio de Janeiro no Palácio Guanabara.
- 15h às 23h: Atividades do Festival Justiça por Marielle e Anderson, no Circo Voador (Lapa), organizado pelo Instituto Marielle Franco, criado e dirigido pela família.
- 16h-18h: Roda de conversa com o tema “Estamos prontas: A radical Imaginação Política das Mulheres Negras”, com Anielle Franco (diretora do Instituto Marielle Franco), Bianca Santana (Casa Sueli Carneiro) e Tainah Pereira (articulação Mulheres Negras Decidem). Além disso, haverá uma oficina de escrita para a produção de cartas de pedido de Justiça por Marielle e Anderson.
- 18h30: Apresentações musicais, abrindo com o maracatu do Cortejo Baque Mulher, seguido pela DJ Tamy, MC Martina e MC Zuleide. Também participam artistas como Karol Conká, BK, Juçara Marçal, Marina Iris, Jéssica Ellen, Lellê e Doralyce. O encerramento será com o Bloco Malunguetu.
- 20h: As famílias de Marielle e Anderson e as organizações que compõem o Comitê Justiça por Marielle e Anderson farão falas no palco do Festival.
Da Redação, com informações da CNN e Instituto Marielle Franco
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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.
Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.
Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.
Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.
Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.
Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.
Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.
Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.
Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.
Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.
Zezé Weiss
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