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Um Brasil digno de ser sonhado

Um Brasil digno de ser sonhado requer a superação dos valores atuais

Por  Eduardo Rombauer

Em uma recente roda de conversa sobre o futuro do Brasil, escutei estas palavras do psicoterapeuta Roberto Gambini:

Vamos supor que o Brasil é um paciente que chega ao meu consultório:

– Doutor, estou muito mal. Está tudo fora do lugar. Eu acho que vou falir. Eu não sei se vou ficar esquizofrênico, se eu vou ficar deprimido, se vou surtar ou se vou me matar. Estou perdido, não sei para onde vou, e vim aqui para o sr. me dizer que direção eu devo tomar.

– Não cabe a mim. Isso deve partir de você. Você sabe de onde você vem?

– Não sei.

– Então se você não sabe de onde vem, também não sabe para onde vai. Conte-me os seus sonhos, Brasil.

Essa metáfora traduz o incômodo que muitos de nós brasileiros sentimos por vivermos aqui nos tempos atuais. Está evidente que nosso sistema político não tem sido capaz de apontar o rumo a seguir, mas esta não é uma falha que devemos atribuir a quem elegemos: é a própria sociedade que parece ter perdido a capacidade de sonhar com o seu – o nosso – futuro.

A conversa com Gambini fez parte de uma iniciativa em busca da restauração desse sonhar. Em novembro do ano passado, o Fórum do Amanhã reuniu, na cidade de Tiradentes (MG), algumas centenas de pessoas, entre intelectuais, inovadores de várias áreas, artistas e estudantes, para dialogar sobre o futuro que queremos para o nosso país: que sonho de Brasil é digno de ser sonhado, e como nos tornaremos aptos a manifestá-lo? Com base em que valores podemos superar nossa atual crise econômica, social e política? Que virtudes já existentes em nossa cultura nos impulsionam a ir além dos limites?

A síntese dos diálogos realizados no evento foi registrada no painel abaixo:

Como o leitor pode notar, as experiências e ideias mobilizadoras geradas pelo diálogo abriram uma avenida de assuntos, que deverão ser discutidos em outras atividades até a próxima edição do Fórum do Amanhã, prevista para ocorrer novamente em Tiradentes, em outubro deste ano. Neste artigo, compartilho cinco ideias inspiradas no que escutei e aprendi neste primeiro encontro, e que ofereço para que o diálogo continue.

  1. A força pulsante das nossas raízes afro-ameríndias

Em vários momentos, as rodas do Fórum do Amanhã reforçaram que o potencial criativo que advém da nossa diversidade ambiental e cultural precisa ser levada mais a sério por nós, brasileiros. Para tanto, cabe observarmos melhor: o que está contido nessa diversidade como potencial para superarmos nossos desafios históricos? E o que as nossas raízes afro-ameríndias podem oferecer para essa superação?

O Brasil é apreciado no exterior em virtude das raízes culturais que muitas vezes não reconhecemos. Com disse o economista e filósofo Eduardo Giannetti, “são coisas que fazemos distraídos e às vezes surpreendem a nós mesmos”, a exemplo do que ocorreu na abertura das Olimpíadas. Nossa criatividade, hospitalidade, alegria e musicalidade são marcantes aos que nos observam de fora. Nossa mistura revela na essência toda uma cultura afetiva, criativa, solidária, que “celebra a vida sem a necessidade de alguma razão lógica, simplesmente pela alegria de existirmos”, destaca o filósofo.

Somos herdeiros de culturas que nos compreendem como seres integrados à natureza, e é desse caldo cultural que sobrevivem alguns valores pré-modernos, que resistem à competição, a eficiência e à acumulação a qualquer preço. São valores herdados principalmente de nossa origens africana e ameríndia, que foram subjugados pela visão eurocêntrica de mundo, e invertidos pelo “sonho americano” de desenvolvimento com base no consumo. O racismo, a aniquilação da cultura indígena, o machismo, o antropocentrismo e a normalização dos privilégios são alguns dos hábitos que provocam feridas em nosso inconsciente coletivo, ameaçam outras formas de vida e ofuscam as virtudes da alma brasileira.

O trabalho de restaurarmos esses nossos traços essenciais não é trivial, já que é difícil lidar com a dor do contato com as raízes machucadas. “A alma brasileira produz coisas sublimes no campo das artes, da música, da arquitetura. Mas é uma alma que está sofrendo. A dor da alma está em todos nós e não sabemos qual é o nome dessa dor”, explanou Gambini.

Uma reação comum a esta dor é aderirmos ao sentimento de inferioridade como nação, aquele que Nelson Rodrigues chamou de “complexo de vira-latas” dos brasileiros. No entanto, observem a crença aí embutida: o que há de ruim em sermos vira-latas, se são eles seres tão amáveis, inteligentes e resilientes?

Esta imagem renovada dos vira-latas surgiu no Fórum do Amanhã como um símbolo das virtudes de uma mistura que está em nossa essência, uma marca da nossa autenticidade. “Yes, nós somos vira-latas”, um participante declarou. Este olhar apreciativo significa aceitarmos que ‘somos quem somos e como somos’, valorizando o que nos é próprio neste viver cheio de riquezas e recursos, que o PIB não é capaz de medir.

  1. Nossa criatividade pode se tornar capacidade de inovação, mas para isso é preciso reduzir as desigualdades

O sociólogo Italiano Domenico De Masi, inspirador e participante do Fórum do Amanhã, desde a década de 1990 vem insistindo no potencial brasileiro de se tornar uma referência de inovação diante das transformações do mundo globalizado. Outros participantes deixaram evidente que ele não está sozinho nessa percepção: diante da tendência econômica de que os bens imateriais e os recursos naturais se tornem ativos cada vez mais relevantes, é claro que o Brasil tem um potencial muito singular.

Somos um país abundante de uma força criativa, que se expressa não só no carnaval, na música e nos jeitinhos brasileiros, mas também na hospitalidade, na alegria, nas “gambiarras”, nas tradições espirituais, nos mutirões e incontáveis soluções que as comunidades criam para se superar, se reinventar e dar a volta por cima. Porém, sermos criativos e cheios de recursos disponíveis para inovar significa que somos inovadores? Ou é preciso transformar nossa criatividade em práticas geradoras de benefícios sociais e econômicos que impactem em larga escala? Como disse o educador Miguel Thompson: “É legal ser criativo, mas muito mais legal é ser inovador”.

Inovação exige que tenhamos capacidade de agregar conhecimento e inteligência a essa criatividade, desafio que naturalmente nos remete ao tema da educação, principal vítima de décadas de agendas políticas imediatistas. Já sabemos que essa deve ser uma agenda prioritária, mas não só isso: priorizar a educação sem uma visão arrojada de futuro é um esforço inócuo. “A educação passa pelas e relações de confiança, e queremos usar o potencial de ternura, de afeto e da flexibilidade da alma brasileira. Mas precisamos, para isso, um projeto de nação”, argumentou a educadora Anna Penido.

A educação que pode construir as bases do Brasil que desejamos não pode ser pensada apenas como um setor de políticas públicas. A Educação que sonhamos é parte de uma tessitura mais ampla de práticas que superam os valores atuais nos campos da cultura, da saúde, da economia e do desenvolvimento social, entre outros. É todo um enredo que requer um projeto comum de futuro para ser empreendido.

Ao mesmo tempo, é preciso reconhecer o óbvio: que sem termos ensino fundamental, saúde pública e saneamento básico minimamente garantidos, a criatividade fica sem base para alçar voo. A criatividade está pulsante em todos nós, mas precisamos construir um mínimo das condições necessárias ao desenvolvimento humano para transformá-la em capacidade de inovação. Assim como a cura da alma nunca é dissociada dos cuidados do corpo, a conexão com nossas raízes não está separada da necessidade objetiva de inclusão daqueles que estão socialmente vulneráveis.

Nesse sentido, a direção apontada no Fórum do Amanhã para cuidarmos do nosso corpo social se condensou em uma palavra: redistribuição. “Temos de dar mais para quem tem menos”, esse tem sido o ‘mantra’ da educadora Priscila Cruz no combate à desigualdade educacional. “Se não formos capazes de colocar no centro da nossa agenda cultural, política, econômica, empresarial e social o desejo de resolver o problema da concentração das riquezas e das desigualdades, seremos incapazes de avançar em direção a uma sociedade e a uma economia do conhecimento”, argumentou o sociólogo Ricardo Abramovay.

Quem compreende que a redistribuição é um benefício para todos propõe uma inversão profunda de valores: prioriza a solidariedade, a empatia e o senso de comunidade, em detrimento da competição, do individualismo e do patrimonialismo.

  1. A ética da integração como eixo de um novo modo de (des)envolvimento

O modelo civilizatório atual nos impele a viver de maneira cada vez mais estratificada e fragmentada, ou em bolhas, como sugeriu o líder comunitário e empreendedor Bruno Capão. Como proceder, então, quando a noção fragmentada de ser humano, que nega atributos de nossa própria natureza, é o motor do modelo hegemônico, marcado por competição e consumo?

Na medida em que as conversas do Fórum do Amanhã evoluíram do diagnóstico para as soluções, a palavra ‘integração’ foi intensivamente reiterada: integrar políticas públicas, integrar gerações, integrar conhecimentos tradicionais e científicos; integrar centros e periferias; integrar economia, sociedade e meio ambiente; integrar realidade sociais; integrar o olhar que vê a natureza como sagrada com as virtudes de um pensamento objetivo sobre o mundo.

Talvez o ponto de partida tenha sido dito pelo líder indígena e professor universitário, Edson Kayapó: “Estamos todos na mesma canoa. Se ela afundar, afundamos todos”. Há uma integração a ser realizada em nossa própria noção de coletividade, que nos possibilite compreender a relevância de nosso pertencimento a um mesmo território, a uma mesma cultura, a uma mesma nação que partilha um futuro em comum, que abrace a nossa polifonia. Uma integração que reconheça também o contexto mais amplo de interdependências com outros povos, outros territórios e outras formas de vida.

Esta visão implica que a noção de desenvolvimento, como mero crescimento econômico, ou até mesmo, como distribuição material de benefícios sociais, precisa ser superada. Nossa ideia de sucesso não pode ser medida pelo PIB per capita, que ignora o valor das relações interpessoais, com a afetividade, o dom de celebrar a vida, a alegria de viver, a musicalidade, entre outros aspectos de nosso legado cultural e espiritual. Para isso, “precisamos substituir a noção de desenvolvimento pela ideia de envolvimento”, sugere Kayapó.

Essas novas métricas de (des)envolvimento requerem a compreensão de como outros valores se manifestam na realidade. E é renovando nosso olhar para as experiências, que podemos pensar um caminho de felicidade possível, onde se integram o novo e o velho; o masculino e o feminino; a ação e a reflexão; as diferenças ideológicas e políticas; o material e o imaterial; as mudanças individuais e as coletivas; a força das raízes e as virtudes da civilização; o trabalho com o prazer; o conhecimento da ciência com a sabedoria ancestral; e assim por diante.

Sabemos que os passos integrativos não são simples de serem dados. Mesmo no Fórum do Amanhã fomos desafiados pelas perspectivas divergentes, quando vieram à tona duas leituras conflitantes sobre como endereçar a redução das desigualdades de gênero e de raça: é necessário realizarmos as reparações históricas destas desigualdades antes de uma integração? Ou é a mudança de consciência advinda da integração que pode provocar a superação das desigualdades?

Quando sentimos na pele a dificuldade do diálogo é que podemos compreender como as bolhas sociais estão incutidas em nós: a fragmentação que nos fere se reproduz pela própria maneira de ser-com-o-outro, mesmo quando gostaríamos que não fosse assim. Como então tornar este diálogo possível, quando nós mesmos não nos encontramos aptos a lidar integralmente com o diferente?

Acredito que a resposta esteja contida no desejo manifestado pelos participantes do Fórum do Amanhã em prosseguir as conversas iniciadas. Para superarmos as polarizações e hábitos fragmentadores, é preciso mais diálogos empáticos e significativos, nos quais possamos expandir nossa capacidade de compreender o outro, aquele que é diferente de nós, como um legítimo outro.

Esta é, sem dúvida, uma experiência transformadora, como declararam vários participantes após o Fórum do Amanhã: “Eu entrei uma pessoa e saí outra”, “O contato com a diversidade me fez sair diferente desta experiência”. Ao dialogar mais, tanto em nossa conversas públicas como as cotidianas, damos vazão ao potencial de nossa diversidade criativa. Precisamos tornar mais forte o desejo de criar, fortalecer e ampliar vínculos, pois assim podemos tratar a dor que nos provoca o encontro com nossas diferenças.

  1. Novas narrativas para outro futuro

Até aqui reforçamos a compreensão de que a mistura é a nossa fortaleza e a base na qual o Brasil, ao se encontrar e dialogar consigo mesmo, pode encontrar um caminho que inova; e vimos que esta integração precisa ser desejada.

Para este desejo florescer, a visão desse caminho deve falar diretamente aos nossos corações. Porém, fomos acostumados a construir narrativas idealistas, abstratas, ideológicas, moralizantes – lógicas tipicamente europeias. A teoria da sustentabilidade, por exemplo, nasceu embalada num discurso técnico, burocrático, distante do nosso viver. E, por isso, se mostra muitas vezes distante de ser aplicada no Brasil. Nesse sentido, precisamos evoluir para narrativas de inclusão, baseadas na percepção de nossa potência e dos desejos que nos são próprios; que nos encantam e nos inspiram a agir de outra maneira.

Por isso o Fórum do Amanhã optou por reunir inovadores, artistas e intelectuais. Os intelectuais nos provocam a expandir a visão sobre as experiências que os inovadores apontam para nosso futuro; mas os artistas podem fazer com que o que surge deste encontro possa conversar com a nossa alma, nomeando as nossas dores e reacendendo as nossas esperanças.

Assim como uma música nos faz dançar, dormir ou despertar, as novas narrativas precisam mobilizar o que está vivo em nosso íntimo e que desejamos manifestar no mundo. A musicista e violonista Andrea Drigo nos mostrou que, assim como a música evoluiu sendo formada por sons cada vez mais dissonantes, uma narrativa que ative em nós este desejo integrador cria possibilidades de harmonia com as diferenças das nossas vozes.

“A síntese da maturidade é a tranquilidade de ser o que se é”, apontou Giannetti. Nossa tarefa, então, é narrar nossa história de modo a nos encantar com o que realmente somos. É na atitude de auto-aceitação que podemos acolher, integrar e curar as dores herdadas. Neste amadurecimento que apreciaremos os valores ameríndios, caucasianos e africanos, que pulsam por debaixo da nossa pele, na nossa genética coletiva, no nosso modo de sentir, de agir, de ser – enfim, integrar as forças que vibram na nossa alma brasileira.

Já que recentemente foi comprovado pela genética a afirmação de Gilberto Freyre de que “todo brasileiro, mesmo o alvo, de cabelo louro, traz na alma, quando não na alma e no corpo (…) a sombra, ou pelo menos a pinta, do indígena ou do negro.”, é preciso que esta realidade se faça mais conhecida para que tenhamos a chance de honrá-la. Se a biodiversidade deste território é a maior garantia do bem-estar das próximas gerações, é preciso resgatar os saberes ancestrais que nos ensinam a valorizá-la. Se temos convicção de que nossa afetividade para dissolver a falta de sentido à vida que nos causa a impessoalidade produtivista ocidental, essa ideia poderia ser expressada sem temor e voar mais alto em nosso imaginário.

Assim sendo, de onde virá essa narrativa capaz de provocar em nós esse reencantamento?

A capacidade convocatória para o sonho de país que buscamos está justamente na voz de todos nós ao manifestarmos este sonhar na prática. São as mais diversas realizações de superação já em curso, sendo comunicadas, que podem revelar o futuro desejável e nos mobilizar a torná-lo viável. Elas comprovam que o modo de vida fragmentado e competitivo que nos leva à infelicidade pode ser transformado em um viver ativo e responsável em nossas comunidades, nossas cidades e nosso país.

Que venham então mais narrativas que nos mobilizem a assumir nossa “vira-latice”, não como um complexo a ser curado, mas como a gênese do futuro verdadeiramente rico e próspero que podemos criar com uma mistura inteligente das riquezas singulares que temos nas mãos.

  1. O “empodimento” do envolvimento: quem sonha o futuro é quem o faz acontecer

O educador e antropólogo Tião Rocha, a partir de sua experiência de algumas décadas junto a comunidades rurais e da periferia no vale do Jequitinhonha, contou em uma das rodas de conversas: “Tem um indicador lá que os americanos chamam de empowerment, que uns chamam de empoderamento. Lá no Jequitinhonha nós chamamos de “empodimento”, – quer dizer que “nóis pode”? “Nóis pode”!”. A idéia de ’empodimento’ expressa esta convicção de envolvimento integral com o mundo trazida pelos inovadores nas rodas de conversa.

Não nos faltaram exemplos de como a vida está sendo reinventada, nas cidades, nas periferias, nas práticas agrícolas, dentro das empresas e também nas famílias. Por todo o país podemos encontrar pessoas cujas histórias de vida demonstram como os valores de superação já se manifestam, se proliferam e que somos capazes de enunciar seus caminhos.

A presença de vários jovens trouxe ao Fórum do Amanhã o brilho e a vitalidade criativa de uma geração que vive este empodimento. Ysani Kalapalo, do Xingu, tem demonstrado como difundir uma voz indígena nas redes sociais de uma maneira capaz de reverter preconceitos. Jaison Pongiluppi, junto ao coletivo EcoAtiva, na Ilha de Bororé/Grajaú, tem integrado ações de proteção ambiental na área de mananciais com atuação cultural na periferia da cidade. Já Ayana Odara, feminista e ativista do movimento negro, tem apostado no acolhimento da pluralidade de vozes como superação da cultura do ódio.

Estes jovens ilustraram o que a diretora do World Resources Institute no Brasil, Rachel Biderman, ressaltou: “Somos nós que temos de nos convocar: sair de casa, sair do sofá e nos autoconvocar para a restauração do Brasil.” É nesta autoconvocação que respondemos ao desafio que o jornalista Gilberto Dimenstein nomeou como ‘uma certa mania de terceirização’ dos brasileiros: “ ‘Alguém tem que resolver isso’, dizemos, mas o ‘alguém’ é uma figura abstrata. Quando você coloca ‘esse alguém sou eu’, você cria milagres”, argumentou o jornalista.

Mas também não podemos nos iludir: é preciso ir além dos protagonismos pontuais e isolados para compreender como cada uma dessas práticas faz parte de conjuntos mais amplos de ações interdependentes, e que ao todo formam uma espécie de mosaico. Precisamos de mais oportunidades de encontros para que estas diferentes perspectivas possam conversar entre si e construir as narrativas compartilhadas, que tecem os sonhos que nosso país precisa sonhar.

Como já notamos, o encontro com o diferente não faz parte de nosso repertório comum, mas é aí que a prática do diálogo revela seu valor: nos dá a oportunidade de encontrar sentidos maiores para o que somos e o que fazemos e, até mesmo, ressignificar nossas diferenças. Com a experiência dialógica, que pudemos vivenciar na prática, criamos novas percepções sobre o nosso lugar no mundo.

Um diálogo significativo nos transforma a partir das nossas consciências, e por isso requer a abertura e a coragem de enxergar com outros olhos a nós mesmos e ao mundo. Como disse o facilitador e consultor Marcelo Cardoso, para dialogar “é preciso que os indivíduos se comprometam com seu processo evolutivo, com seu processo de transformação, honrem suas sombras, encontrem significados, encontrem suas próprias propostas”. Muitos participantes do Fórum do Amanhã declararam que desejam prosseguir com essa experiência, justamente porque sentiram na pele os benefícios desse exercício de superação.

A experiência do Fórum do Amanhã reforçou o entendimento de que, seja individualmente, seja coletivamente, os recursos que mais precisamos estão dentro de nós. Daí a importância de aceitarmos quem somos e como somos. Como argumentou Gambini: “Nós não temos de buscar ideias extravagantes em algum pensador ou em alguma cultura exótica. Não temos que importar nada, está tudo aqui. Em nós. Esses valores da alma, basta colocá-los no agora, no contemporâneo, e fazer uma ligeira adaptação: nós temos ética, valores de vida coletiva, de aceitação do outro. O que tem de ocorrer é uma transformação da nossa consciência”.

Fonte:  EDUARDO ROMBAUER

 
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HORA DE VESTIR A CAMISA DO LULA

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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

 

 

 

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