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O traje do vaqueiro nordestino

O traje do vaqueiro nordestino

Alguns registros históricos sobre o traje do vaqueiro, indumentária única e exclusiva dos bravos vaqueiros do Nordeste brasileiro

Por Zezé Weiss

Segundo pesquisa de Rafaela Britto, em matéria publicada no blog Império Retrô em abril de 2016, o mais antigo registro da indumentária do vaqueiro sertanejo data de 1816, época em que o  empresário e pintor português Henry Koster (1793 – 1820) mudou-se para o Brasil por motivos de saúde e aqui tornou-se senhor de engenho.

De acordo com Britto, Koster percorreu o nordeste brasileiro, e registrou suas impressões da estrutura socioeconômica do povo no livro “Viagens ao Nordeste do Brasil”, publicado primeiramente em Londres sob o título de “Travels in Brazil”, onde  descreve um vaqueiro que conheceu nos sertões do Rio Grande do Norte, entre Açu e Mossoró:

Sua roupa consistia em grandes calções ou polainas de couro taninado mas não preparado, de cor suja de ferrugem, amarrados da cinta e por baixo víamos as ceroulas de algodão onde o couro não protegia. Sobre o peito havia uma pele de cabrito, ligada por detrás com quatro tiras, e uma jaqueta, também feita de couro, a qual é geralmente atirada num dos ombros. Seu chapéu, de couro, tinha a forma muito baixa e com as abas curtas. Tinha calçados os chinelos da mesma cor e as esporas de ferro eram sustidas nos seus pés nus por umas correias que prendiam os chinelas e as esporas. Na mão direita empunhava um longo chicote e, ao lado, uma espada, metida num boldrié que lhe descia da espádua. No cinto, uma faca, e um cachimbo curto e sujo na boca. Na parte posterior da sela estava amarrado um pedaço de fazenda vermelha, enrolada em forma de manto, que habitualmente contém a rede e uma muda de roupa, isto é, uma camisa, ceroulas e, às vezes, umas calças de Nanquim. Nas boroacas que pendiam de cada lado da sela conduzem geralmente farinha e a carne assada no outro lado, e o isqueiro de pedra (as folhas servem de mecha), fumo e outro cachimbo sobressalente. A todo este equipamento, o sertanejo junta ainda uma pistola, cujo longo cano desce pela coxa esquerda, e tudo seguro.”

Outro registro histórico relevante sobre a indumentária do vaqueiro nordestino data de 1902, e encontra-se no livro “Os Sertões”, onde o grande escritor brasileiro Euclides da Cunha (1866-1909),  retrata a vestimenta do vaqueiro da Caatinga baiana:

O TRAJE DO VAQUEIRO

 “O seu aspecto recorda vagamente, à primeira vista, o de guerreiro antigo exausto da refrega. Às vezes são uma armadura. Envolto no gibão de couro curtido, de bode ou de vaqueta; apertado no colete também de couro; calçando as perneiras, de couro curtido ainda, muito justas, cosidas às pernas e subindo até as virilhas, articuladas em joelheiras de solas; e resguardados os pés e as mãos pelas luvas e guarda-pés de pele de veado – é como a forma grosseira de um campeador medieval desgarrado em nosso tempo. Esta armadura, porém, de um vermelho pardo, como se fosse de bronze flexível, não em cintilações, não rebrilha ferida pelo sol. É tosca e poenta. Envolve ao combatente de uma batalha sem vitórias… A sela da montaria, feita por ele mesmo, imita o lombilho rio-grandense, mas é mais curta e cavada, sem os apetrechos luxuosos daquele. São acessórios uma manta de pele de bode, um couro resistente, cobrindo as ancas do animal, peitorais que lhe resguardam o peito, e as joelheiras apresilhadas às juntas. Este equipamento do homem e do cavalo talha-se à feição do meio. Vestidos doutro modo não romperiam, incólumes, as caatingas e os pedregais cortantes…”

Rafaela Britto traça ainda um perfil sociológico do grande herói do sertão:

O vaqueiro percorre as pastagens, preenchendo o espaço vazio dos sertões com seus aboios de tristeza e de saudade. Sempre montado a cavalo, o cuidador do gado enfrenta diariamente o sol escaldante e a constante seca da caatinga, sem descanso, sem divagações.

Ao vaqueiro, ícone do imaginário popular do Nordeste brasileiro, é atribuído o título de herói mitológico. Mas a fama desse guerreiro romântico dos sertões não se sustenta só na sua fé e força física: o vaqueiro nordestino é também conhecido por suas habilidades com a agulha, que constituem uma indumentária rica em técnicas artesanais.

Os vaqueiros sertanejos, antes de serem homens destemidos, são exímios artesãos: o uniforme de vaqueiro, todo em cor de ferrugem, consiste em peças em couro cru de veado ou bode, confeccionadas a partir de técnicas primitivas de curtimento. Retiram-se todos os pelos do animal. A peça torna-se macia, flexível e resistente ao calor e aos perigos da caatinga. Ainda segundo Britto, o traje do vaqueiro é composto de:

Chapéu de couro com um barbichado (cordão) preso ao queixo, para não se perder na correria do sertão;

Gibão (ou véstia), um tipo de paletó o qual o vaqueiro decora com ricos motivos e bordados;

Guarda-peito ou peitoral, colete de couro usado por baixo do paletó e decorado com pespontos;

Perneiras, que vão da virilha até o pé; são duas pernas soltas de calça, ajustadas ao corpo e atadas por correias de couro;

Luvas, para proteger o dorso das mãos contra espinhos; a parte interna consiste em duas tiras de couro, uma prendendo o polegar e outra para o restante dos dedos;

Sandálias, sendo mais comum um modelo próprio para uso cotidiano, que protege os dedos dos pés.

Todas as imagens desta matéria encontram-se na matéria originária de Rafaela Britto, publicada em abril de 2016 no blog Império Retrô, onde estão creditadas seguinte forma: 1) Reprodução de foto histórica; 2) Reprodução de foto histórica; 3) Gibão, foto de  Geyson Magno.

Block

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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Cangaceiro

Lindas Fotos não me canso de velas… Novamente obrigado!!!

Clarice

Keep calm and no me aperreie

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