Pesquisar
Close this search box.

Trajano Jardim: E então, que quereis?…

Trajano Jardim: E então, que quereis?…

Estes dias, preso em casa, em fase pós-operatória de cirurgia de catarata, ouvindo as notícias cada vez mais catastróficas em relação à situação do Brasil, lembrei-me do poema de Maiakovski, que tem o título acima e diz na sua primeira parte:

Não estamos alegres, é certo,

mas também por que razão

haveríamos de ficar tristes?

O mar da história é agitado.”

Em 1º de abril de 1964, caminhando pela Avenida Rio Branco com o saudoso companheiro Erasmo, gráfico como eu e comunista de boa cepa, ele, sentindo a minha angústia de jovem, me dizia que a luta é feita de fluxos e refluxos e que precisamos saber conduzi-la conforme a situação concreta nos apresenta. O velho Erasmo tinha, sem dúvida, lido Maiakovski.

Hoje vemos o movimento sindical, em letargia pela “síndrome da ilusão do poder”, em razão de a maioria dos seus melhores quadros terem assumido cargos institucionais durante o governo democrático e popular. Essa situação criou a ilusão de que a luta de classe era coisa do passado e o trabalho de mobilização, que sempre foi o alicerce de sustentação dos movimentos sociais, foi abandonado.

O arcabouço sindical construído pós-ditadura de 1964, nas chamadas “novas formas modernas do novo sindicalismo”, do movimento metalúrgico da década de 1970, se exauriu. A sua construção foi com base nas relações de trabalho com o patronato europeu, que de certa forma, na sua origem, reconheciam o direito de negociação dos sindicatos de trabalhadores. Diferente da maioria do patronato brasileiro, originado do regime escravocrata do engenho, cuja forma de negociação era a chibata.

Quando no governo o pensamento majoritário passou a ser o da socialdemocracia, de que seria possível conviver indefinidamente com um “governo de coalizão”, não se organizou a transição desse estágio para um governo de fato “democrático e popular”.

Assim, passou-se a um entendimento de luta contrário aos clássicos teóricos, que “nega a oposição de princípios entre o liberalismo e o socialismo, nega a teoria da luta de classes, considerando-a inaplicável a uma sociedade estritamente democrática, administrada segundo a vontade da maioria”.

Após o golpe parlamentar-jurídico-midiático de 17 de abril, verdadeira pantomima levada a efeito por uma Câmara corrupta, com apoio de parcela da sociedade que foi às ruas com camisas amarelas, pessoas que bateram histéricas as panelas que nunca usaram para a sua real serventia, já que essa tarefa pertenceu, sempre, aos seus serviçais subalternos, parte de nós foi tomada pela angústia e pela pressa pequeno-burguesa.

O movimento fragmentado em 10 centrais não conseguiu causar danos nas hostes do inimigo. Mesmo a Greve Geral de 4 de abril não foi capaz de forjar a unidade necessária para enfrentar o tsunami que se abateu sobre os trabalhadores e suas organizações. Direitos históricos foram retirados, sem que verberassem com firmeza a reação nas ruas.

As angústias que me tomaram no fatídico 1964 estão latentes hoje, embora sem a sofreguidão voluntarista da juventude, amainada pelo passar implacável do tempo, continuo com a visão no futuro. Com esperança de que, mesmo sem saber quanto tempo pode demorar, os trabalhadores organizados irão “fundir-se com as mais amplas massas trabalhadoras, antes de tudo com as massas proletárias, mas também com as massas trabalhadoras não proletárias”, como previu Lênin, e venceremos esse tempo de escuridão, como dizem os versos de Maiakovski:

As ameaças e as guerras

havemos de atravessá-las,

rompê-las ao meio, cortando-as

como uma quilha que corta as ondas”.

Trajano Jardim -Jornalista e Professor Universitário


Salve! Pra você que chegou até aqui, nossa gratidão! Agradecemos especialmente porque sua parceria fortalece  este nosso veículo de comunicação independente, dedicado a garantir um espaço de Resistência pra quem não tem  vez nem voz neste nosso injusto mundo de diferenças e desigualdades. Você pode apoiar nosso trabalho comprando um produto na nossa Loja Xapuri  ou fazendo uma doação de qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Contamos com você! P.S. Segue nosso WhatsApp: 61 9 99611193, caso você queira falar conosco a qualquer hora, a qualquer dia. GRATIDÃO!


Revista Xapuri

Mais do que uma Revista, um espaço de Resistência. Há seis anos, faça chuva ou faça sol, esperneando daqui, esperneando dacolá, todo santo mês nossa Revista Xapuri  leva informação e esperança para milhares de pessoas no Brasil inteiro. Agora, nesses tempos bicudos de pandemia, precisamos contar com você que nos lê, para seguir imprimindo a Revista Xapuri. VOCÊ PODE NOS AJUDAR COM UMA ASSINATURA?
ASSINE AQUI
 

0 0 votos
Avaliação do artigo
Se inscrever
Notificar de
guest
0 Comentários
Feedbacks embutidos
Ver todos os comentários

Parcerias

Ads2_parceiros_CNTE
Ads2_parceiros_Bancários
Ads2_parceiros_Sertão_Cerratense
Ads2_parceiros_Brasil_Popular
Ads2_parceiros_Entorno_Sul
Ads2_parceiros_Sinpro
Ads2_parceiros_Fenae
Ads2_parceiros_Inst.Altair
Ads2_parceiros_Fetec
previous arrowprevious arrow
next arrownext arrow

REVISTA

REVISTA 113
REVISTA 112
REVISTA 111
REVISTA 110
REVISTA 109
REVISTA 108
REVISTA 107
previous arrowprevious arrow
next arrownext arrow

CONTATO

logo xapuri

posts recentes