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“Infra-mundo subversivo”, com Herbert De Paz

“Infra-mundo subversivo”

“Infra-mundo subversivo”, com Herbert De Paz

Herbert De Paz é um artista visual de El Salvador, que reside em solos brasileiro desde 2013. Traz em seu trabalho questões bem marcadas a respeito da história da América Latina, passando por lugares de memória e imaginário…

Por Amanda Olbel/Mídia NINJA

Demonstra que sua vontade é questionar e entender a origem dessa representação colonialista de corpos racializados, através das técnicas de colagem, desenho e pintura, e propondo assim uma subversão desse olhar supremacista.

Nos conta que iniciou carreira como técnico em arquitetura e design de produtos, antes de se entender propriamente como artista: coisa que só veio acontecer posteriormente, quando decidiu aprender a falar português para vir cursar Artes Visuais na Universidade Estadual do Rio (UERJ). Na época, sem conhecer nada, nem ninguém, permaneceu por um ano e meio na casa de seu grande amigo Pauan, que o acolheu durante o período. Já em 2014, mesmo não tendo um ateliê próprio, incentivado pela fotografa e amiga Ana Alexandrino, começou a produzir pequenas colagens com os recortes da revista de História da Biblioteca Nacional, e vem desde então, amadurecendo e expandindo essa prática, principalmente com sua série “Iconografia das Sombras”.

Acervo Hebert de Paz

“Esses registros são documentos que ilustram como foi o mundo no passado e eu trago personagens para contar uma história que está nessas imagens. Tem uma responsabilidade na manipulação dessas figuras, e, não tenho interesse em usar imagens de indivíduos racializados sendo violentados. O próprio contexto dessas imagens é de uma violência. Então, eu tento trazer um elo de comunicação entre nós eles, um vínculo que possa trazer fôlego para não esquecermos que ainda estamos disputando as narrativas”

Agora, a respeito da técnica da pintura, o artista revela que sempre foi algo que o instigou e, quando era mais jovem, diz ter sido recorrente o impulso de se aproximar a esses materiais, porém, nunca de fato havia se dedicado a isso até a pandemia se instaurar. Antes disso, trabalhava como assistente da pintora contemporânea visceral, Adriana Varejão, e foi ela que lhe deu de presente as tintas com as quais deu início a sua série “La Puerta de Xibalbá”, usando como referência registros arqueológicos.  Desde 2019, Herbert também compartilha o mesmo teto com a artista plástica assombrosa Marcela Cantuária, por quem se sentiu inspirado a dar início ao seu processo de produção das imagens históricas através da pintura.

Falando um pouco sobre suas escolhas de conteúdo, comenta sobre o fato de historicamente, pessoas negras e indígenas que foram lesadas por esses processos, sempre resistiram, seja na luta física ou na perpetuação dos seus saberes.

Acervo: Hebert de Paz

 “Na escola aprendemos que a História e o passado são coisas absolutas, mas quando entendemos que só nos ensinaram a história dos opressores que “venceram”, encontramos milhares de possibilidades para imaginar o passado a partir de uma herança indígena e negra e por isso estou aqui hoje falando disso. É nesse pensamento que eu cimento a minha produção”.

O artista diz ainda que se propõe a imaginar o mundo de hoje e o continente das Américas, não como blocos separados por limites geo-políticos, e sim, como experiências similares culturais de antes da colonização e o que elas se tornaram depois disso. Comenta em seguida que por ser de El Salvador, um país com similaridades à cidade do Rio, seu entendimento sobre nação sempre se reduziu a um território restrito pela língua e pelas fronteiras, mas que sua vinda ao Brasil, fez com que conseguisse expandir seu pensamento através do contato com novas narrativas: histórias de povos milenares, tanto os nativos do nosso continente, como os que vieram do continente africano.

“É esse encontro de saberes que eu tento trazer no meu trabalho. Gosto muito de pensar em nosso território como “Améfrica” cunhado por Lélia Gonzalez, entendendo que a experiência da colonização pode ser muito similar entre Brasil, o Caribe e a América Central, não é só sobre fronteiras políticas e sim sobre legados ancestrais. Somado a isso também lembro muito do pensamento de Frantz Fanon na hora de fazer meus trabalhos, não citando diretamente mas tá sempre pulsando”.

Acervo: Hebert de Paz

Herbert enfatiza a importância da espiritualidade para os povos milenares, e de como as culturas indígenas e africanas cultuavam às forças da natureza. Diz ter profunda admiração por isso, sendo um dos motivos por incorporar a temática em suas obras. Já a questão da violência se apresenta como uma candeia ao fato de que a colonização não acabou, e foi somente atualizada, e meio essa tragédia, devido a uma predominância do cristianismo e do sistema capitalista, faz parecer de que “os brancos venceram”.

“Mas a luta por emancipação ainda não acabou e eu tento criar diálogos com meus pares. O próprio Fanon insiste em que já que a colonização foi um processo violento, a descolonização será violenta por consequência. Eu consegui formalizar esse pensamento recentemente visitando os textos dele. Acho muito curioso que a leitura das minhas pinturas mais “violentas” geram reações diferentes nas pessoas, tem gente que acha que o trabalho não precisa ir por esse caminho e tem gente que me instiga a fazer mais… aí rola uma identificação ou não, risos. Afinal, nós artistas trabalhamos no campo do simbólico né, então eu também ainda não sei muito bem como a gente incorpora essa violência”. 

Em suas obras, De Paz, incorpora propositalmente nessas imagens uma estética que se aproxima as artes e da cosmovisão das antigas civilizações Mayas. Na descrição de alguns desses trabalhos já antecede um pouco o sentido por detrás da pintura, mas que por si só acabam reverberando com uma atmosfera muito própria, de grande intensidade, usando muitas cores vibrantes. Um dos teus trabalhos mais potentes é o “Guardião do sono”, assim como “Lua Cheia” que foram justamente uns dos trabalhos de abertura da série “La puerta de  Xibalbá”.

Acervo: Hebert de Paz

Na tradição, Xibalbá é o infra-mundo, o lugar dos mortos e da escuridão, assim como o mundo em que vivemos seria o contrário; os antigos Mayas tinham um pensando dual e suas práticas culturais e religiosas eram realizadas para manter o equilíbrio ente os mundos.

“Essa pintura é bem importante para mim porque foi a primeira em que eu quis trazer um ar de misticismo para a pesquisa, eu fiz ela pensando em uma experiência de sonho que tive onde acessei a memórias ancestrais e fiquei por muito tempo com isso na cabeça. Acho que a pintura é bem explicita, é o rosto de um homem com pinturas tradicionais, ele é o guardião, o sonho é a cosmovisão. La Puerta de Xibalbá foi esse sonho que eu tive, era mais um portão gigante do que uma porta. No meu sonho eu cheguei a esse portão e desde o lado fora vi muitas coisas, mas não cheguei a entrar”.

Já no quadro “Lua Cheia”, o artista cria uma fisionomia de transe à deusa Ixchel: o principio feminino da cosmovisão Maya. Ela é a entidade responsável pela fertilidade, a tecelagem, a cura e a magia. É a chave dos mistérios presentes nas fases da Lua que são revelados em sua plenitude. Conta ser uma pintura também muito especial, relacionada a mediunidade e feitiçaria.

Herbert De Paz, é um artista fantástico, tem obras que permanecem se acrescentando e se desenvolvendo com força e realizará agora, em meados de Agosto, uma exposição coletiva na Gentil Carioca, com seus últimos trabalhos de sua produção, incluindo esses mencionados ao longo do texto. Já tendo participado também de exposições individuais e coletivas em galerias como Centro Municipal Helio Oiticica, Despina, Caixa Preta, Parque Lage, Tanya Bonakdar Gallery, entre outras.

O artista compartilha em suas redes sociais fotos pessoais e de seus trabalhos, através do perfil @herbert_depaz. E para acompanhar os próximos artistas da nossa rede, e ter acesso aos anteriores, siga o @planetafoda, frente de mobilização LGBTQIAP+ da Mídia NINJA.

Acervo: Hebert de Paz

Acervo: Hebert de Paz

https://xapuri.info/elizabeth-teixeira-resistente-da-luta-camponesa/

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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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