Rubacão da Paraíba
Por Lúcia Resende
– Não deixe de comer o rubacão!, alertou-me mana Iêda quando, em setembro passado, informei que íamos a João Pessoa. Disse-me ela que na orla ou nas barracas próximas ao Centro de Artesanato eu encontraria fácil.
Lá chegando, no primeiro restaurante, perguntei se tinham “rabecão”. A resposta foi uma cara de estranheza e um sonoro não. Achei estranho, mas passei os olhos rapidamente pelos pratos do cardápio, pedimos uma carne de sol e pronto.
No outro dia, insisti, numa barraca da orla:
– O senhor tem “rabecão”?
De novo a cara de espanto e a negativa. Pedimos outro prato. Enquanto preparavam, comentamos que certamente Iêda havia se enganado, viajeira que é, e o prato recomendado devia ser de outro lugar.
Só no terceiro dia, ao examinar o cardápio, achamos a palavra mágica: RUBACÃO era o nome, e não “rabecão”. Estava explicado! Fizemos o pedido.
O prato chegando à mesa já foi aquele êxtase, porque a gente come primeiro com os olhos, né? O sabor só confirmou a primeira impressão, e o meu desafio a partir dali foi descobrir como fazer aquela delícia.
Não demorou encontrar um paraibano na feirinha gastronômica de Cabo Branco disposto a me contar todos os segredos. Ali mesmo decidi que levaria os ingredientes na bagagem e assim fiz. Comprei o arroz vermelho, o feijão “macassa” (aprendi ali que era o feijão de corda, como conhecemos aqui), o charque, a carne de sol, o queijo de coalho e a manteiga de garrafa, e enfiei na mala.
De volta, família reunida, chegou a hora de colocar em prática o aprendido e de saborear. Não houve quem não gostasse – até porque não tem como! Mana Iêda foi convidada, claro, e aprovou também. Chega de prosa, vamos ao que interessa!
[divider] Ingredientes[/divider]
2 xícaras de feijão macassa
3 xícaras de arroz vermelho ou branco
300 gramas de charque (na falta de charque, usar carne de sol)
300 gramas de carne de sol
Cebola, alho, sal e pimenta a gosto
200 gramas de queijo de coalho
1 xícara de nata ou uma lata de creme de leite
2 xícaras de leite
4 colheres de manteiga de garrafa
2 a 3 colheres de óleo
Cebolinha e coentro para finalizar
[divider] Modo de Fazer[/divider]
Se o feijão for maduro, deixe de molho umas duas horas, para amaciar. Dessalgue as carnes e corte-as em cubos. Corte o queijo em cubos e reserve.
Coloque o feijão para cozinhar em água e sal, até que fique “ao dente”.
Enquanto isso, em outra panela, na manteiga de garrafa, frite o alho até dourar, acrescente a cebola e refogue até que fique transparente. Junte as carnes cortadas em cubinhos, a pimenta (a gosto), refogue bem e vá pingando água para que os cubinhos fiquem macios, sem desmanchar. Reserve.
Em uma panela maior, refogue o arroz no óleo, acrescente um pouco de água (umas 4 xícaras), sal, e deixe cozinhar. Quando estiver quase seco, acrescente o feijão escorrido, o leite, prove o sal, acrescente uma pitada de pimenta do reino, misture bem e deixe terminar o cozimento.
Para finalizar, adicione o creme de leite, os cubos de carne (reservando um pouco para decorar) e o queijo de coalho. Corrija o sal, desligue o fogo e tampe a panela por cerca de um minuto, para o queijo derreter.
Aí, é só decorar com o cheiro verde e a carne reservada, levar à mesa e esperar os elogios! Hummm…
[authorbox authorid=”” title=”Sobre a Autora”]
Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.
Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.
Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.
Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.
Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.
Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.
Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.
Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.
Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.
Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.
Zezé Weiss
P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!