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Marconi Burum: Chico Mendes, o herói da necessidade atemporal 

Chico Mendes: o herói da necessidade atemporal

Por: Marconi Burum –

Premiado em 1987 com o “Global 500”, maior condecoração da Organização das Nações Unidas para personalidades que se destacam na defesa do Meio Ambiente, Chico Mendes foi brutalmente assassinado em 22 de dezembro[1] do ano seguinte, aos 44 anos de idade e luta. Líder sindical, ambientalista, político e seringueiro por profissão, Francisco Alves Mendes Filho, o Chico Mendes, nasceu em 1944 no seringal Porto Rico, município de Xapuri, no estado do Acre. 44 anos antes de seu nascimento, era esse mesmo estado o palco das principais disputas de terras entre o Brasil e a Bolívia, consagrando-se vencedores no campo de batalha os trabalhadores brasileiros da matéria-prima para a borracha e fazendo do Acre, definitivamente, território nacional – de grande relevância.

Durante todo esse período – até os dias de hoje – foi desse território amazônico que surgiu a principal inspiração para as mudanças de paradigmas no que tange ao Meio Ambiente brasileiro, sobretudo, os mecanismos e arcabouços legais de proteção da Floresta. Patrono do Meio Ambiente, Chico Mendes pautou sua vida na insistência da luta pela Amazônia, pelos povos da floresta e pelos trabalhadores extrativistas, com destaque, os seringueiros. Esforço esse que lhe rendera homenagens – em vida e pós morte –, mas levou ao sacrifício sua existência material.

A trajetória do ambientalista seringueiro começou bem cedo. Conforme lemos em sua biografia, narrada inclusive por seus filhos. “Aos nove anos, Chico Mendes já acompanhava seu pai na floresta. Aos onze tornou-se seringueiro em tempo integral. Nesta mesma época a família mudou-se para a colocação Pote Seco, no seringal Equador. Durante o dia Chico cortava seringa, caçava, e à noite Chico lia alguns livros e se inteirava das notícias através de jornais quase sempre com atraso de semanas. Com doze anos Chico Mendes conheceu Euclides Fernandes Távora, aliado de Carlos Prestes. Foi com Euclides Távora que Chico começou a entender o significado da exploração dos seringueiros, a luta de classes”[2].

É a partir de Távora que Chico Mendes passa a ter acesso aos noticiários da Central de Moscou, da BBC de Londres e da Voz da América, sendo, portanto, influenciado à construção de conteúdos que o destacavam dos demais trabalhadores quanto ao ímpeto da luta contra as desigualdades e injustiças sociais e econômicas ocorridas na Amazônia e que atingiam toda a humanidade, na sua concepção.

Foi também por meio dos movimentos eclesiais de base da Igreja Católica, por articulação e formação da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG e pela proximidade com outro líder sindical, Wilson Pinheiro (também assassinado pela causa, em 1978), que Chico Mendes crescia em si ardorosamente a vontade de conscientizar e organizar todos os trabalhadores e povos da floresta a fim de darem um basta à opressão, fosse essa institucionalizada pelo Estado, ou concretizada quando do avanço da agropecuária depredatória ao Meio Ambiente.

Essas condicionantes levaram Chico Mendes a ingressar na objetividade política e, mesmo contrariando alguns de seus companheiros, candidatou-se a vereador em 1977, pelo MDB [3], elegendo-se, certo de que o mandato somente agregaria valor na organização dos trabalhadores, o que se confirmou com a fundação de um novo sindicato em Xapuri e ainda mais forte para instrumentalizar a luta dos seringueiros.

O espaço institucional e político fez com que Chico Mendes ganhasse mais terreno[4] a fim de pressionar o Governo Federal e sensibilizar as organizações e organismos, nacionais e internacionais, diante das queimadas e dos desmatamentos intensificados na Amazônia. Chico, agora fundador do Partido dos Trabalhadores – PT – e amigo próximo do também fundador da Central Única dos Trabalhadores – CUT – e posteriormente Deputado Constituinte, Luiz Inácio Lula da Silva, candidatou-se ainda deputado estadual e prefeito de Xapuri, porém, não logrando êxito nessas duas últimas eleições.

Em 1985 Chico Mendes marca a história do Brasil trazendo para o 1º Encontro Nacional dos Seringueiros, ocorrido na UnB, em Brasília, um novo conceito de sustentabilidade e economia que seria conhecido, ademais, como RESERVA EXTRATIVISTA – assim institucionalizada pelo Estado brasileiro. Sua capacidade organização e liderança no Encontro chamou a atenção do mundo, das autoridades, da imprensa global e, consequentemente, de seus inimigos fazendeiros. O ambientalista foi apresentado ao diretor e documentarista inglês, Adrian Cowell, produtor, entre outros, da série “A Década da Destruição”, realizado em parceria com o cinegrafista Vicente Rios e a Universidade Católica de Goiás – UCG [5].

Foi Cowell quem apresentou o seringueiro amazônida ao mundo e o levou, para indicação à United Nations Environment Program – UNEP, a fim da consagração premiada. Melhor abordagem que se pode imprimir de Adrian Cowell e sua relação com Chico Mendes, retiramos das próprias palavras do cineasta, assim sendo: “Quando este filme chegou na UNEP, claramente apresentou uma idéia bem melhor do que estrangeiros comprando pedaços da floresta amazônica.

Primeiro, a ideia não veio dos estrangeiros, mas de brasileiros, e melhor ainda, brasileiros que viviam dentro da floresta amazônica. Segundo, a defesa da floresta era baseada nos direitos dos posseiros assegurados na Constituição brasileira. Finalmente, numa época quando as reservas e florestas nacionais pareciam como vácuos sugando invasores de todos os lados, os seringueiros defendiam suas reservas efetivamente e de graça. Quando preenchi o formulário para Chico ganhar o maior prêmio do Meio Ambiente, o Global 500 da ONU, fiquei surpreso ao ver como o seu caso era óbvio e fácil de justificar”[6]. Cowell nos mostra os vários ângulos da luta dos povos da floresta. Sucessos e fracassos. Avanços e recuos. Sobretudo, destruições e conquistas. Cowell nos mostra o aspecto simbólico-prático que é reportada em toda a vida e nos atos de Chico Mendes.

A verdade é que a luta e a dor de Chico, não somente ao Brasil, entretanto, ao Planeta Terra, por suas atuais e sempre vindouras gerações (caráter intergeracional), significam a verdadeira esperança à vida humana, sob três matizes: horizonte civilizatório; horizonte evolutivo; e horizonte bem-vivido! Para deduzir um final (meramente prático à atemporalidade desse herói) a este artigo que pretende a homenagem, faz-se necessário trazer à luz da reflexão central uma análise de Chico Mendes, em suas palavras coletadas na exatidão no documentário de Adrian Cowell e Vicente Rios, “A Década da Destruição”, a saber: “Se um mensageiro descesse do céu e garantisse que minha morte ajudaria a fortalecer nossa luta, ela até valeria a pena. A experiência nos ensina o contrário. Não é com grandes funerais e manifestações de apoio que iremos salvar a Amazônia. Eu quero viver!”, assevera Chico Mendes [7].

………..
[1] Por triste coincidência, 7 dias após seu aniversário de nascimento (dia 15 de dezembro).
[2] (Trecho – feitas as adaptações necessárias – retirado da página www.institutochicomendes.org.br
[3] A linda época em que o MDB não era um partido de fisiologistas “baratos”, todavia, o partido político da contra-ditadura militar e da justiça social.
[4] Paradoxo simbólico proposital, haja vista que o “terreno” que Chico conseguia à época está no campo da narrativa e da luta por Justiça Social e respeito ao Meio Ambiente, tão mais que uma realidade de Reforma Agrária cuja garantia ao direito de propriedade não seja somente aos latifundiários, todavia, a todos os pequenos agricultores, ribeirinhos, extrativistas etc.
[5] Hoje, PUC-GO.
[6] Artigo de Mary Allegretti, intitulado “O inglês que descobriu o seringueiro”, em 07/11/2008, replicadas pelo Portal G1.
[7] Tiramos como conclusão que Chico Mendes, esse herói brasileiro, acertara praticamente tudo na vida, mas estava errado em sobre um ponto: “morte e causa”. Às vezes, apenas às vezes – e foi o que aconteceu com a morte-causa de Chico Mendes – esse ato extremo da não-desistência, portanto, da resistência consequente, resolve muito, muitas coisas e mazelas do mundo. Chico Mendes, que queria viver, morreu para dar e devolver a vida de cada um de nós… desse Planeta. Viva Chico Mendes!

ANOTE:
Foto de Capa de Denise Zmekhol, conforme informação da autora, a quem agradecemos a compreeensão pelo uso original sem crédito (por desconhecimento nosso) e o direito de uso nesta matéria, a nosso ver relevante para se fazer justiça à memória e ao legado de Chico Mendes. 
A seguir, Carta de Xapuri, lida pela atriz Lucélia Santos, em Xapuri, Acre, no encerramento do Encontro Chico Mendes 30 Anos, no dia 17 de dezembro de 2018. https://www.facebook.com/chicomendes30anos/videos/316194489235107/?t=0
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