A Caliandra
A Caliandra é uma planta originária do Cerrado brasileiro, que cresce em arbustos lenhosos de até 4 metros. Suas flores aparecem na primavera e no verão e suas folhas são perenes. Conhecida popularmente pelos nomes de flor-do-cerrado, ciganinha, caliandra, flor-do-capeta ou esponjinha, inicia sua floração no auge da estação seca, destacando-se em meio à paisagem seca e poeirenta. Este símbolo do cerrado é descrito também pela poesia…
Por Luiz Martins da Silva
I
Manhosa, não é rosa,
Pois, não cede, não serve
A banquete, ramalhete,
Replantes, enxertos…
II
Não às intenções mais belas,
As sinceras e as malévolas,
Mas, nem por isso deixa disso,
Essa, de ser flor-perífrase.
III
“Da próxima vez,
Que for a Brasília…!”
Ora, leva-se em pensamento,
De coração, gosta é do chão.
IV
Por mim, savana, planalto…
Fica a ode num contralto:
Caliandra, A flor do Cerrado,
Espontânea, centro do mundo.
V
Tudo o que pede é florir,
Mas, para a beleza parir,
Precisa deixar-se em paz,
Sobrevive sem artifícios.
VI
Terra, terreno, terreiro…
Bem-vindos os pioneiros,
Mas, em juras de áreas verdes,
Seu quinhão no árido torrão.
VII
Se nem as lambidas do fogo
Podem, por fim, dizimá-la,
Não a arranque, proteja-a,
Se a queres, mesmo, admirada.
VIII
Reflorestá-la, impossível.
Conversa não palatável.
Surpresa, na caminhada,
Isto sim, que agradável!
IX
À espera, sim, de estampas.
Fica bem em camisetas,
Selos, postais e filipetas
Marcadores, páginas felizes.
X
Prometa aos nossos filhos:
De tudo irá defendê-la.
São muitas as ameaças,
Mas, não podemos perdê-la.
Luiz Martins da Silva – Jornalista, Professor, Poeta e Escritor. Poema publicado originalmente por www.chicosantanna.wordpress.com.
Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.
Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.
Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.
Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.
Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.
Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.
Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.
Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.
Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.
Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.
Zezé Weiss
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