Mãos Contrárias – mãos ásperas, mãos agrestes
Minhas mãos não nasceram para as palavras,
mas para as ações pesadas que tantas vezes dispensam
o tão inútil pensar.
Minhas mãos em sua essência
são mãos ásperas, agrestes,
que de rugas se revestem na perpetuagem do tempo.
Minhas mãos nasceram para amansar cavalos
e segurar bois.
Procuram, no entanto, amansar as palavras
e em vão tentam dominá-las.
Nasceram as minhas mãos para as tetas da vaca
e a feitura do queijo.
E espremem e apertam e buscam extrair o leite das palavras.
Estas mãos nasceram para derrubar madeira,
para rachar lenha, para bater estaca,
esticar o arame, levantar cercas.
Mas lutam com as palavras, dividem as palavras, puxam as
palavras e acabam erguendo cercas entre elas e as palavras.
Minhas mãos nasceram para laçar o gado
e tentam laçar as palavras.
Nasceram para o cultivo da terra e tentam lavorar as palavras.
Nasceram para cortar a cana e tentam moer as palavras.
Nasceram para construir açudes e tentam represar as palavras.
Minhas mãos nasceram para abrir buracos
E tentam tanger estrelas.
Minhas mãos vivem escravas
de um ofício forçado para o qual não foram feitas.
Minhas mãos vivem escravas do verbo e da palavra,
porque nasceram para os calos e para o braço da enxada.
É por isso tenho certeza que minhas mãos,
sempre presas, nunca conseguiram nada.
ANOTE AÍ:
Antonio Victor é talento goiano, prata da casa, nascido e criado em Formosa, cidadezinha de pouco mais de 100 mil almas, localizada na região metropolitana do Distrito Federal.
Versátil, o intelectual Antonio Victor, graduado em Letras pela Universidade de Brasília (UnB), escreve contos urbanos e poemas matutos com a mesma maestria.
Seu primeiro livro de poemas,“Cicatrizes da Alma”, foi publicado em São Paulo, em 1977, com o apoio e incentivo do poeta Menotti Del Picchia. Em quase 40 anos de carreira, seus poemas foram muitas vezes musicados e gravados por ícones da música popular brasilera, como Chico Rey e Paraná.
Modesto, o poeta se define com simplicidade:“Escalei árvores e muros, tomei banho de chuva e de rios, amava ouvir os causos dos mais velhos e aprendi o sabor da poesia em suas falas”.
foto: Aldimar Nunes Vieria – Entorno Urgente
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