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1968 Ditadura Abaixo: Teresa Urban, em legado para os netos

1968 Ditadura Abaixo: Teresa Urban, em legado para os netos

Relato da efervescência de 1968 da avó Teresa para os netos:  A escritora Teresa Urban, falecida em 2013, deixou um relato extraordinário, em quadrinhos, do movimento estudantil no Paraná em 1968

Por Liliana Lavoratti, no blog Avosidade, coluna neto curte vǒ

► A primeira vez que a jornalista, escritora e ambientalista paranaense Teresa Urban (1946-2013) pensou em escrever o livro 1968 Ditadura Abaixo (Arte e Letra Editora) foi em 1992, quando nasceu o primeiro de seus quatro netos, João. A motivação era que João conhecesse suas raízes. Evitando que crescesse sem informações sobre um dos mais relevantes capítulos da resistência à ditadura militar no Paraná. Ele e todos os “joões” de sua geração e das que viriam depois. Mas a ideia foi deixada de lado. O recém-nascido parecia muito pequeno para uma história tão grande.
A autora participou ativamente do movimento estudantil em Curitiba (PR), enquanto cursava Jornalismo na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Foi presa em 1970. Torturada e exilada no Chile, e cumpriu pena como militante de organização clandestina. Nessa fase tumultuada da vida de Teresa nasceram seus dois filhos – Gunther, antes do exílio, e Lupe, na capital chilena. Hoje, eles são pais de Cecília e Miguel; e de João e Newton, respectivamente.
“O tempo foi passando e eu fui adiando, olhando o bebê virar menino, depois garoto e adolescente. Veio Cecília e eu adiando. Chegou Newton e a história estava dispersa, as raízes, espalhadas. Já estava virando mesmo uma história de vó. Melhor contar logo”, relatou a autora na apresentação da obra, lançada na capital paranaense em 2008 – quarenta anos depois dos acontecimentos vividos e narrados por Teresa, uma das lideranças do movimento estudantil em Curitiba, nos anos 1960 e 1970, sob a repressão da ditadura militar.

Juventude e ditadura

Tomada a decisão, o primeiro desafio foi buscar o jeito certo de despertar a curiosidade dos jovens do século 21 para um conteúdo que parece tão distante no tempo. Sobretudo em um país que até hoje não julgou os crimes cometidos depois do golpe militar de 1964. Um período da história brasileira que permanece obscuro para a maioria da população. Com escassez de informações, inclusive sobre o paradeiro dos restos mortais de dezenas de desaparecidos durante os chamados “anos de chumbo” da ditadura – do fim de 1968, com a edição do Ato Institucional nº 5 (AI-5), em dezembro daquele ano, até o final do governo Médici, em março de 1974.
Outro fator considerado pela autora foi a diferença dos interesses das gerações atuais em relação aos de 40 anos atrás. Quando milhares de estudantes em todo o Brasil questionaram o status quo, enfrentando a violência do regime militar e arriscando a própria vida em nome de seus ideais. “Foi um ano em que a juventude, em várias partes do mundo, se descobriu enquanto categoria específica, deixando de ser mera reprodução de pais e avós para enxergar o mundo com seu próprio olhar”, afirmou Teresa em entrevista para reportagem sobre o livro, publicada por mim na Gazeta Mercantil em dezembro de 2008.

Quadrinhos

Para fazer a ponte de quatro décadas entre as gerações, Teresa se cercou de uma assessoria importante – o próprio neto, à época com 16 anos, e outros jovens com um traço comum: tinham nascido muito depois de 1968, “já de mouse na mão, dedinho clicando botão. Eles indicaram o jeito, eu remexi no baú da memória, nos arquivos de jornais, revistas, documentos da Dops e em velhos álbuns de fotografia. E foi assim que saiu este livro”, segundo declarou a autora. A obra recebeu da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ) o selo de “altamente recomendado” para jovens e adolescentes e foi adotada em escolas.

1968

Livro de Teresa Urban, lançado em 2008

É um livro de história em quadrinhos. Na qual João e Maria são os personagens (fictícios) principais. Textos curtos e uma ampla gama de informações rápidas. Retiradas de publicações da época. Publicidade, música, cinema, literatura e notícias sobre outros acontecimentos que contextualizam o período; inclusive o antes e o depois de 1968.
 
1968
 
Essa linguagem contemporânea, disposta em páginas semelhantes à internet, leva os leitores às notas publicadas em jornais e revistas daquele período. Mostra as prisões de estudantes, os exílios, a publicação do AI-5, bem como a documentação que faz parte dos arquivos da Delegacia de Ordem Política e Social (Dops), atualmente disponibilizada pelo Arquivo Público do Paraná.

Efervescência

Embora o livro aborde as circunstâncias do movimento estudantil em Curitiba e retrate a cidade em 1968 – as ilustrações de Guilherme Caldas ambientam os fatos e os costumes da época –, a história poderia se passar em qualquer lugar do Brasil, fazia questão de ressaltar Teresa.
Como disse João, também na apresentação da obra e aos 16 anos de idade, “existem vários jeitos de contar uma história, e minha vó, escrevendo este livro, usa um bem diferente do normal. Ela mostra vários pontos de vista sobre o que ocorreu naquele ano. Com muitas curiosidades sobre a cultura, os esportes, a literatura, a música e o modo de vida. Mostra também as dificuldades enfrentadas por aqueles que viveram na época. E, principalmente, daqueles que participaram do movimento estudantil”.

1968

João, neto de Teresa, hoje com 24 anos

Hoje, João, aos 24 anos, um cientista da computação com mestrado em engenharia de recursos hídricos – formado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), a mesma que foi palco das manifestações do movimento estudantil protagonizado por Teresa – valoriza ainda mais a atitude da avó de ter se preocupado em registrar a efervescência política, cultural e comportamental de 1968. Embora tivesse acesso a essas memórias sem o livro, ele ressalta que a obra possibilitou a mais pessoas conhecer o que aconteceu pela voz de quem participou dos fatos.

“Teresa queria compartilhar uma experiência que considerava relevante, e os netos foram só um pretexto para isso. O fato de isso não estar ocorrendo agora não significa que no futuro não possa se repetir”, enfatiza João.

Paraná

A cientista social e professora da UFPR Lennita Oliveira Ruggi, 35 anos, uma das principais pesquisadoras da equipe que ajudou Teresa a construir o livro, fala com entusiasmo sobre a parceria. “Foi transformador participar do trabalho. Esse registro que ela tinha tanta vontade de deixar e de forma acessível para as novas gerações, com criação coletiva de personagens e ambientes, recheados de detalhes para caracterizar esteticamente cada coisa que estava sendo mostrada”, relata. Filha de um casal que conviveu com Teresa na militância e no jornalismo em Curitiba, foi aos 24 anos e já com mestrado, em 2008, que ela diz ter tomado consciência do que antes só ouvira falar.
 

Manoela Salazar, jornalista e pesquisadora (foto: Amanda Cavalcanti)

“Não conhecia nada dos temas que pesquisamos. Tinha só ouvido falar, por exemplo, no acordo MEC-Usaid [série de acordos entre o Ministério da Educação e a United States Agency for International Development, com objetivo de implantar no Brasil o modelo norte-americano nas universidades brasileiras e, com isso, forjar o novo quadro técnico adequado ao novo projeto econômico brasileiro]. Também não tinha ideia da centralidade do Paraná no movimento estudantil de 1968 contra esses acordos. Foi muito empolgante conhecer as técnicas de confrontação dos estudantes com a polícia. De distribuição de panfletos subversivos, ocupação dos espaços públicos com peças de teatro. Teresa teve a preocupação de refazer toda essa efervescência. Com imagens, desde a programação de cinema, televisão e música da época”, comenta.

Busca obsessiva

A jornalista Manuela Salazar, 29 anos, outra assistente de pesquisa para o livro, também ressalta a riqueza do aprendizado na parceria com a autora“Teresa era quase obsessiva na busca da reprodução fiel da época. Não medíamos esforços para retratar o clima no qual os estudantes estavam envolvidos em sua luta. Pelo protagonismo na mudança dos valores da sociedade conservadora. Para isso, foi necessário ler os jornais e revistas. Ir atrás de muitos documentos. Encontrar os nomes dos dirigentes de diretórios estudantis, dos relatórios de repressão da Dops”, sublinha Salazar, que durante o trabalho para o livro tinha 20 anos.
Fonte: https://avosidade.com.br/1968-ditadura-abaixo/

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