Seletividade editorial e deformação da liberdade de imprensa: Lula brilha. Mídia boicota
Em seguida, a recepção calorosa dedicada a Lula no Parlamento Europeu, em Bruxelas, assim como o seu discurso no Plenário da Casa, tampouco provocaram uma cobertura midiática nacional à altura da relevância política da ocasião.
Desnecessário lembrar que o ex-chefe de Estado brasileiro obteve nessa oportunidade uma espécie de desagravo, após a perseguição que o levou a suportar uma prisão injusta que perdurou por 580 dias, até que fosse libertado sem culpa formada, para assistir à proclamação da suspeição do seu juiz-algoz, Sergio Moro, em julgamento do Supremo Tribunal Federal.
Não bastasse isso, a exitosa viagem de Lula sucede o desastre diplomático que representou a participação vergonhosa do atual mandatário, Jair Bolsonaro, na reunião do G-20.
Tais evidências exigem uma séria ponderação sobre as manobras que certos órgãos de imprensa são capazes de empreender, em favor de interesses inconfessáveis. São constatações que fragilizam e desmoralizam os protestos de tais organismos em resguardo da liberdade de imprensa.
Afinal, toda vez que os meios de comunicação alijam da opinião pública informações relevantes, com o objetivo de desequilibrar a balança política, resta profundamente violado justamente o princípio segundo o qual a imprensa se legitima a partir da honestidade dos serviços que presta à sociedade.
Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.
Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.
Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.
Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.
Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.
Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.
Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.
Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.
Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.
Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.
Zezé Weiss
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